15 de maio de 1860
Nesse tão esperado dia publicava-se:
“A camara municipal desta cidade faz saber, que no dia 15 do corrente mez, ao meio dia, ha de ter lugar o acto solemne da inauguração dos trabalhos da estrada de ferro desta cidade a Jundiahy, e para não passar sem uma publica demonstração de regosijo, convida aos seus Municipes a illuminarem as frentes de suas casas nas noites de 15, 16 e 17 do corrente mez, e para que chegue a noticia de todos mandou-se affixar o presente edital. Paço da camara municipal em Santos 12 de maio de 1860. – J. J. Bitancourt, presidente. – M. L. Ferreira, secretario.”

O jornal Revista Commercial não era diário – circulava de dois em dois dias, ou de três em três; por essa razão somente a 18 de maio sairia com sua primeira página, e parte da segunda, ocupadas com a grande notícia, que mudaria os rumos de nossa terra:
“No dia 15 do corrente, ao meio dia, teve lugar a ceremonia da inauguração dos trabalhos da primeira estrada de ferro d’esta Provincia.
Concorrêrão á este acto solemne, além do Exm. Presidente da Provincia, Drs. Chefe de Policia, official do gabinete, commandante do corpo policial de S. Paulo, uma deputação da camara municipal e todos os membros da (nota do autor: faltou alguma palavra) desta cidade, alguns Srs. Deputados geraes e provinciais, o Exm. senador barão de Antonina, e um grande numero de pessoas mais gradas, não só desta cidade como da capital, não sendo maior o concurso das ultimas pelo infundado receio da febre amarrella.
O batalhão da Guarda nacional, em grande uniforme, formando alas ao longo de uma linha demarcada por bandeirolas, a qual figurava os trilhos da futura estrada, abrilhantou a festividade… (continua abaixo)

… Depois de um discurso analogo recitado pelo Rev. conego, …. seguio-se a benção da primeira terra, que foi cavada e conduzida pelo Exm. Presidente da Provincia em um carrinho de mão ao lugar em que principia a linha de ferro. Este carrinho é de jacarandá, todo ricamente guarnecido de prata, com uma pá do mesmo metal e um disticho em que os empreiteiros fazem delle offerecimento á Provincia de S. Paulo; é uma obra primorosa.
Em seguida os Srs. Drs. Joaquim Octavio Nebias, e Martim Francisco Ribeiro de Andrada recitarão dois discursos que, se obtivermos copias publicaremos… (continua abaixo)

… Finda a ceremonia, o secretario da Camara municipal desta cidade lavrou a competente acta do acto solemne, a qual foi assignada pelo Exm. Sr. Presidente da Provincia e a maior parte das pessoas que assistirão ao mesmo.
Concluido isto, começou o almoço ao qual concorrerão, muitas pessoas importantes, entre ellas varias familias desta cidade, vestidas com ellegancia e o bom gosto que sempre distingue as bellas Santistas. Infelizmente porém, por mais de uma vez foi interrompido este acto por uma forte rajada de vento, que desbaratou a barraca, partindo uma das cumieiras e varrendo parte da mesa.
O Exm. Sr. Presidente da Provincia fez o primeiro brinde à Companhia da Estrada de Ferro, ao qual, depois de tocar a banda de musica do batalhão da guarda nacional, respondeu o Sr. Aubertin, superintendente da Companhia, com um eloquente discurso, recitado em inglez, (que amanhã publicaremos) e findando com a saúde aos Concessionarios… (continua abaixo)

… Seguirão então vários brindes, entre outros, aos Srs. Rotheschild, de Londres etc.; começando porém o tempo a tornar-se chuvoso, o Exm. Sr. Presidente da Provincia, com o brinde a SS. MM. o Imperador do Brazil e a Rainha d’Inglaterra, terminou a festividade, que, melhor favorecida pelo tempo, se teria prolongada, e que os empreiteiros tanto desejo tinhão e tanto sacrificio fizerão para tornal-a splendida e jubilosa. …” (continua abaixo)
Notas do autor:
1 – Ao saber que o superintendente da ferrovia, Sr. Aubertin havia proferido eloqüente discurso em inglês, o espirituoso correspondente do jornal no Rio de Janeiro se saiu com esta: “O discurso pode ter sido eloquente, mas será que alguém compreendeu alguma coisa?”
2 – Esse temporal que se abateu no momento das festividades parece ter sido uma predestinação. Os ingleses haveriam de ter sérios problemas com os mesmos, durante todo o transcorrer das obras, bem como durante a operação da ferrovia, no trecho compreendido entre Santos e Paranapiacaba, conforme veremos mais adiante.

… Mauá, Monte Alegre, Pimenta Bueno, são nomes que d’ora avante os Santistas trarão impressos nas páginas da gratidão, que, na frase colorida de um habil escriptor, é a memoria do coração! Vivão os protectores da estra de ferro de Santos a Jundiahy.” (trecho final do discurso proferido pelo deputado estadual Martim Francisco)

A sociedade santista realmente comemorou o fato.
Além da citada iluminação das casas teve, ainda, o grande baile.
Em seu editorial o jornal, numa antevisão do futuro, declarava que após a Independência do Brasil, este fato era o mais importante para nossa província.
Não cessavam as manifestações de esperança em um futuro promissor, não só para a cidade de Santos, mas, também, para toda a província paulista.
Podemos, no entanto, fazer uma comparação entre a população naquela época, com as torcidas uniformizadas de nossas equipes de futebol nos dias de hoje:
a paixão abraça e enaltece, mas, também se torna rude em sua crítica quando seus anseios são frustrados.